segunda-feira, 28 de março de 2011

Uma homenagem de Susana Silvério

SERÁ QUE EU SOU POETA?





Esse texto é uma homenagem a Jefferson Magno Costa

Olha, eu confesso. Primeiro eu usei a religião, estava já à mão, eu tinha fácil em casa, depois a Filosofia, depois a Ciência e durante todo o processo a Poesia. Passeei por caminhos tortuosos, pela política, pela música, pelo teatro, por outras artes, pelas explicações agnósticas, pelas teorias, pelas conversas de bar, crenças antigas, tradições, por uma ou outra face da cultura. Mas eu juro: nunca usei antidepressivos, nem usei (todas) as outras drogas! Essas eram tentativas, vãs, se sanar minha obsessão por encontrar respostas.
Eu fui escrevendo, escrevendo, escrevendo pra ver se a dor sumia, se a secura na garganta, a vontade de perguntar passava, tentava pensar em outra coisa, ou melhor, tentava não pensar em nada, mas eu virava noites em claro, repassando uma frase que li, ou avaliando o filme que assisti. Por muitas vezes eu ouvi dizerem que eu estava ficando louca, ou que eu era dramática, ou que fazia aquilo pra chamar atenção. Poucas pessoas realmente entendiam que eu sofria muito por dentro, e ainda sofro.
Por que uns vão ouvir que não podem ter filhos e vão superar, eu vou reviver isso todo dia, o tempo todo. Uns vão ser expulsos da Igreja e vão ridicularizar a denominação, eu vou lamentar até que ponto chegou essa instituição (E eu lamento mesmo, profundamente). Uns vão se casar, ter seu emprego, ir a Igreja no domingo. Eu vou ficar na olaria, passando por mais e mais reparos. E como eu invejo uma vida, humilde, desproposital, como a de algumas meninas da minha idade que dormem ás dez e meia e acordam cedo pra ir trabalhar. Eu passo noites em claro, há 10 anos. Falando nisso, fico rindo dos pastores da iurd que pregam na madrugada, por que dos problemas que eles relatam, eu devo ter 80% (risos, muitos). Eu não tenho a audácia de pregar um Gezuz que tire como num passo de mágica, uma pessoa das dívidas, da depressão, do desemprego, a troco de uma visita na igreja, ou a troco de um toque nos 348, 368, sei lá. Eu não desperdiço nenhum copo d’água com isso.
Não posso pregar o que não vivo e o que eu vivo é o processo, etapa por etapa! Eu estou sofrendo, cada vez que a lixa do marceneiro passa. Eu estou remoendo meus erros na construção de um futuro mais coerente pra mim. Estou imitando Cristo, um pouco mais a cada dia, caindo no velho erro de vez em quando, me arrependendo, levantando, assim por diante. Fico fascinada com as histórias do tipo ‘dormi drogado e acordei crente’. Mas não é assim comigo. Eu sofro e reflito em cada desafio. Deito no chão da Igreja no meio do louvor, ligo pra pessoas ás 2 da manhã pra pedir perdão. Faço sessões de terapia em bancos de ônibus e choro 3 dias por causa de uma criança que vi pedindo esmola no centro da cidade. E pouco me importa se minha unha está com esmalte velho, pela metade ou se repeti o mesmo vestido nos últimos 5 casamentos. Eu visito meus tios, dias de terça á tarde. Prefiro a companhia de crianças de 11 anos do que de pessoas que conheço há 11 anos. Pesquiso sobre formas de economizar água e coloco em prática. Dou aulas de reforço escolar de graça, escondido do meu marido.
Veja bem, não torno tudo isso público pra ouvir comentários me dizendo que sou isso, ou aquilo. Só eu sei o quanto me dói ser assim, só eu sei quantos kilos já engordei nas minhas sessões da madrugada a fora. Só eu sei quanto tem na minha carteira pra pagar a coca-cola que quero beber agora – nada. Só eu sei o que me custa me submeter ás ordens de um líder sem questionar, por que dessa vez eu quero fazer dar certo. Só eu sei o que é ouvir que devo aceitar que meu marido é o cabeça, quando às vezes penso, que ele deve estar mais pra cabeça de alho. E isso, nós sabemos, têm multidões de implicações. Eu sei o quanto me custa ter em meu currículo um longo histórico de problemas com patrões, professores, orientadores, entre outras autoridades. Eu sei o peso que tem meu sobrenome, o peso que tem meu passado, o peso que tem minha figura pública e o pré-conceito que muitos formaram ao meu respeito. Eu sei quem sou. Ou não sei quem sou? Eu sempre me perco quando o assunto é esse!
Gostaria tanto de acreditar que sou um macaco, menos macaco que o ser evolutivo anterior na cadeia. Ou que sou uma alma sendo reciclada em outro corpo, com ainda milhões de chances. Seria tão mais fácil... mas não acredito! E la´vou eu lidar com todas essas minhas características-bomba hoje mesmo, agora. Ora leio Clarisse e me sinto mais confortável, ora leio Fernando e me sinto mais deprê. Me identifico com um, me diferencio de outro. Mas minha ajuda vem mesmo quando estou em oração. É conversando com meu Pai que vou aprendendo um pouco mais sobre mim. Sei que eu sou, no mínimo, uma pessoa excêntrica. Que ás vezes minha profundidade soa como abismo para muitos. De lá me apego à Deus com todas as minhas forças. Sou mesmo carente, dramática, complexa, bipolar, guerreira. Aberta, mas às vezes arredia. Amorosa, mas ás vezes cruel... Intensa. Intensa até demais. Como diria Nietzsche vou 'procurando razão na loucura' todos os dias. Como disse no começo, vou escrevendo pra ver se a dor passa. Que dor? a dor de ser como eu sou. Isso é ser poeta? Não sei. Mas respeito-os ainda mais, se eles são assim como eu.

Susana Silvério escreve no blog:

http://susanasilverio.blogspot.com/2010/09/sera-que-eu-sou-poeta.html

Obs. Ela pensa que não é poeta, mas é! Seu texto vale mais do que dezenas de poesias que se veem por ai.....

Um comentário:

  1. Quanta honraaaaaaaaaaaa!! Obrigada Adelino!!! Estou sem palavras!!! Não sabia que tinha publicado esse texto meu!!! Um grande abraço meu irmão, mesmo depois de tanto tempo ainda continuo na olaria!!!!

    Susana
    http://susanasilverio.blogspot.com

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